29 novembro 2012

Adeus, Porto Seguro.


E mesmo quando estamos ali, juntos, parte de mim se rebela e eu sei que não podemos continuar. Mas é mais fácil me deixar acomodar, me deixar envolver e abraçar e as vezes nem parece farsa quando me aquece o peito entre aqueles braços que um dia chamei porto seguro. E eu fui capaz de evitar o fim por meses, adiando o que eu sabia ser inevitável, por que toda vez que você sorri meu coração se encolhe e eu quero mais e mais me afastar (é que eu não quero machucar você também). Mas você e eu sabemos ler o meu olhar e todas as sombras que vão por trás dão retrato claro de como as coisas devem ser: aquele canto do meu armário deve ter apenas as minhas roupas, e seu perfume não pode estar na estante do banheiro. É pedir muito de mim que eu viva por nós dois. Eu nem descobri ainda o que é viver por mim. Então mil desculpas, mas é adeus, é definitivo, é o que tem pra agora. É o que dá pra fazer com o que eu consegui juntar de mim. Não dá pra viver a dois quando partida em uma só. Não há abraço que segure. Não há beijo que mantenha. A gente até tentou, mas não deu. E você me apertou, me quis, me desejou, tentou me colar com saliva e amor, mas sabemos bem que eu sou porcelana sem reparo. Sou boneca para uma única infância, um único palpitar. Então agora é hora de ir embora. Mas está tudo bem e você não precisa chorar. Olha pra mim, teu mar azul de paixões, e te despede com um sorriso. Diga adeus com amor. Por que, céus, eu te amei. Com tudo de mim, com tudo o que deu, enquanto deu. Mas era pouco, e te ver sorrir me encolhia o coração e o que eu mais quero é expandir. Quero é ser gigante. Nada mais de portos seguros e abraços feitos de terra firme e pés no chão. Agora eu vou voar,  vou céu azul, vou brisa da manhã. Agora vou. Fica bem. Ou voa também. Adeus.

15 novembro 2012

Ah, se eu vou.

Verificava o telefone a cada 3 minutos, por pura força do hábito, mas nunca esperara realmente que alguém ligasse. Então, levou um tremendo susto quando a música da série favorita irrompeu pela sala, tomando seus ouvidos e fazendo piscar o aparelho como uma discoteca. Uma breve olhada na tela lhe mostrou apenas um número desconhecido e, desconfiada, ela o levou o celular ouvido.
- Alô?
- Oi. É a Luísa?
- É sim. Quem é aí?
- É o Alberto.

      Silêncio.
- Quem?
- Alberto, amigo do Maurício. A gente se viu na sexta-feira, na pizzaria.
      Levou um segundo refletindo.
- Ah, claro, Guilherme. Por que não disse logo. – Escutou-o suspirar do outro lado do fone, mas não reconheceu a emoção. Alívio? Resignação, talvez?
- É, pode ser. É o Guilherme então.
     Mais silêncio.
- E então, o que foi? Pode falar.
- Eu peguei seu número com o Maurício...
- Obviamente...
- E eu queria te chamar pra gente fazer alguma coisa. Cinema talvez. Ou um barzinho.
- Por mim pode ser, eu acho. Quando?
- Eu pensei em hoje.
- Hoje?
      Sentou-se na cama e olhou o relógio. Morando longe como morava, já era muito tarde pra sair de casa.
- Ou talvez amanhã.
- Amanhã parece bom pra mim. Qual vai ser nossa programação?
- Eu não sei, a gente pode decidir na hora. Conheço um lugar bem legal pelo centro...
- Estou confiando no seu julgamento.
      Ela o escutou rir.
- Quem você chamou?
- Você.
      Ficou em silêncio por um momento.
-Só eu?
- É. Só eu e você. Isso é um problema?
- Não, eu acho. É só uma surpresa. Eu não estava esperando por isso, certamente.
- Olha, se você não quiser ir, não tem problema...
- Não seja bobo. Vamos sair. Barzinho. Samba. Tem que ter samba.
      E a risada gostosa dele, que ela lembrava bem de ter escutado durante toda a sexta-feira, na pizzaria, pareceu aquecê-la um pouquinho ao ecoar pela linha.
- Tudo bem, com samba.
- Não reclama, viu. Barzinhos com sambas são sempre os mais divertidos.
- Acredite em mim, não estou reclamando.
- Tudo bem, então... – E ela não conseguiu evitar sorrir, por que desconfiava que não era exatamente do samba que falavam agora. – A gente se encontra onde, então?
- Nas barcas, pode ser?
- Claro.
- Vou fazer uma reserva pra nós então.
- Ui, que fino. Eu costumo batalhar pela minha mesa como uma boa guerreira épica.
- Vou poupar o trabalho da sua clava hoje.
- Ora, muito obrigada.
      E ela sabia que ele podia escutá-la sorrir, por que sua voz de repente estava feliz e ela se sentia patética por deixar tanto sair. Ainda era só o telefone, só um barzinho, e ela já não conseguia descer das nuvens.
- Nove e meia, então?
- Tudo bem por mim. Não se atrase.
- Eu sou o rei da pontualidade.
- Que bom. Por que eu sou a rainha dos atrasados, mas ainda sim sempre consigo ficar sozinha nos pontos de encontro da vida.
- Não se preocupe, não vou te deixar sozinha.
      E aquilo soou forte demais na conversa displicente, e ela sentiu o rosto esquentar.  Agradeceu aos céus por todo o contato ainda ser apenas uma ligação, por que ela certamente precisaria praticar não morrer de timidez até nove e meia do dia seguinte. Suspirou.
- Tudo bem, então. A gente se vê amanhã.
- Isso aí. Boa noite.
- Boa. Tchau...
      E a voz parecia morrer, e o coração parecia sambar, e ela desligou a ligação ainda um pouco fora do ar. Ela e ele, do sorriso, da fotografia, do nome engraçado de senhor antigo, do apelido que era um outro nome, que ele detestava, da piada que a fez chorar de rir na mesa. E ela sabia, ela sentia, ia ser uma boa noite. Ia ser uma ótima noite. Ah, se ia.


10 novembro 2012

Já é tarde (Ya no llores).




    Os pés marcaram na areia o longo caminho que percorrera. E ele caminhara pelo que lhe pareceram horas, forçando um silêncio até mesmo de seus próprios pensamentos. Pois sua consciência pesava, maltratando-o e recordando-o, quando ele lhe dava a brecha, de que toda sua sanidade estava por um fio. A mulher que ele amava estava a um passo de partir. E a culpa não era de nenhum outro, se não dele.
    Não fazia mais de uma hora ele finalmente confessara, após meses de uma consideração culpada, que andara vendo outra mulher. Mas sentia que agora, as vésperas de um casamento, não era justo com ela, a sua noiva, firmar este compromisso sem que estivesse ciente disso. E ela, tal como ele esperara, apenas perguntara se aquilo queria dizer, para eles, o fim.
    E ele não tinha uma resposta.
    Era óbvio que ele não queria deixá-la, ele disse a si mesmo, mas tampouco conseguia olhar dentro daqueles profundos olhos castanhos com a sinceridade que um dia sentiu. Mas a devoção e o amor que lhe dedicava, esses ainda eram os mesmos da primeira vez. Talvez fossem até maior agora. Ele aprendera que não podia viver sem ela, coisa da qual duvidava quando começaram. Definitivamente, ele a queria muito mais agora, quando estava a um passo de perdê-la. Na iminência do adeus, ele aprendera a amá-la muito mais.
     Mas era igualmente óbvio que aquilo não fora de todo suficiente. Ele se deixou levar, e antes que percebesse estava frequentando a casa e dormindo com a mulher que um dia fora sua secretária. Ela saiu, deixou o emprego, e antes que pudesse se impedir estava nos braços dela. Estava nela. Uma e outra vez, uma noite após a outra. Ele não prestava. Ele sabia. Mas ele a amava. Ele sabia agora. Mas tudo o que precisou fazer para ter certeza... o fazia sentir um homem pior. Um homem sem moral, sem decência. Por que ele a amava, e mesmo naqueles dias ele sabia disso, mas ainda assim, fora capaz de fazer o que fez. Mais de uma vez. Mais de uma noite, mais de um final de semana. 
    Ele a vira, a amante, e cuidara e abraça e acarinhara o corpo pequeno de riso fácil, com as mesmas mãos que tocavam a futura esposa e os mesmos lábios com os quais mentia pra ela. E ele não podia voltar para ela com esses mesmos lábios, essas mesmas mãos, essa mesma alma marcada pela vergonha de ter ferido a mulher que amava. A mulher que era a correta, que era sua, que lhe prometera sempre estar, que o desejara tanto a ponto de querer que fosse sempre eterno para sempre diante de algo maior. E ele, o pária, quebrara todas as promessas e jogara fora todo o futuro e agora queria perdão. Mas ele sabia que não devia. Sabia que era sua hora de ir embora. Por que ela merecia mais.
      Então, quando caminhou de volta pela praia que deveria ser onde eles se tornariam tão infinitos quanto os grãos de areia, ele tinha a resposta para a pergunta que ela tinha nos lábios, tinha nos olhos, tinha no peito e nas lágrimas que escorriam e que ele podia ver mesmo a distância. E ele também chorava, chorava por tudo o que eles jamais seriam, por que ele não merecia e ela merecia muito mais. Então ele veio e se sentou ao lado dela, e não tocou-lhe as mãos, por que sentia-se sujo, e disse-lhe apenas que não chorasse mais, que não valia a pena, que os cacos do que se quebra deve se varrer porta afora, e não alma adentro. 
     Ele não ia ficar, eles não iam ser, por que ele não sabia encará-la depois de tê-la traído. Ele não queria ver nela as feridas que causara. E ela guardou silêncio, mas não as lágrimas, e ele olhou-a nos olhos - uma ultima vez, pensou, - e disse que não chorasse mais. Era o fim, mas só pra ele. Pra ele, já era tarde. Pra ela, era apenas o começo. O começo do infinito de outros amores. O começo de um mar de novas possibilidades.

09 novembro 2012

Inferno astral (Me tira daqui)

Se eu pudesse fugir, eu fugiria. Eu estou tão cansada, eu estou tão sedada, eu estou tão farta de respirar esse ar que me arrasta pra baixo. Não sei mais o que fazer de mim, e tempo nenhum que eu me dê ajuda, por que eu sou feita de brecha e desespero e noite insone com histórias de amor que não são minhas. Não acredito mais em nada que não é essencial, e o padre me disse que to sofrendo de falta de fé. Tô sofrendo, tô sim, mas fé é tudo o que me resta e se eu perder isso, não sei o que vai ser de mim. Então vou contar até cem, vou fazer uma oração, vou pedir pro futuro vir mais rápido e me levar pra algum lugar. Essa estática ainda vai me tirar de mim. Me tirar de mim pra sempre. Me tirar daqui.



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