18 dezembro 2011

Ô pequena.

Era estranho pensar em quanta dor ela carregava. Ela era tão pequenina. Tão criança. E quando usava seus vestidos coloridos, como hoje, parecia ainda mais inocente que de costume. Mas era só se aproximar um pouco e contemplar os olhos castanhos pra encontrar a verdade. Ela era menina crescida, mulher vivida, cheia de cicatrizes e memórias. A que escapa pelo vestido, no joelho, é só mais uma de muitas. Muitas marcas pra um corpo tão pequeno. Muita dor. E o sorriso era falso, cansado, cheio de lágrimas que corriam por trás, por dentro, onde ninguém devia ver. Mas eu podia vê-las descendo, rolando rosto abaixo, como se ela fosse feita de vidro. Aquela menina, tão pequena, frequentemente inocente, pra mim é transparente. E eu estendo minhas mãos, inútil, sem saber o que fazer. Ah, pequenina, não chora. Não chora que a dor não passa.


15 dezembro 2011

Falando do Outro




De primeira, o choque. Eles não são quem eu sou. Então, é lógico dizer, eu não sei quem são. Talvez nem sejam. Sei lá se existem. Sei lá quem dizem que são.
Não os entendo. Não falam como eu. Me olham esquisito, usam pouco roupa, muita roupa, fazem paz, fazem guerra. Mas nada como eu. Nunca como eu. Sou melhor. Sou pior. Sou diferente. Sei lá quem são. Sei lá quem sou.
(Ponho os óculos e acendo a luz). Vou olhar de novo. Mais de perto. Vou falar mais devagar. Aprender a língua deles. Vou escutar. Vou observar. Vou tentar entender. Não vou julgar. Não tenho mesmo o direito. Não sou ninguém. Ninguém mais, pelo menos. Alguém igual. Mas diferente. Tão diferente (mas só na mente). Vou olhar pra frente, estender a mão, dançar aquela música que é tanto pra eles e não significa nada pra mim. Qualquer coisa pela paz. É assim que se faz.
(E o tempo passa). E a gente aprende. E a gente é um pouco um no outro. A gente não faz mais sentido agora do que fazia antes, mas a gente tenta. E a gente acha que melhorou. Que aprendeu. Mas espera só surgir um outro outro. Talvez a gente faça tudo de novo. Talvez não. Talvez vá ser mais fácil, mais rápido, menos doloroso. Um pouco mais do toma-lá, dá-cá. Aí, gente vira um pouco um do outro.
E isso é ouro.

ps: esse texto foi escrito pro meu trabalho final de antropologia, mas como eu fui obrigada a lê-lo em voz alta na sala, acabei enganada, achando ele legal. foi assim que ele veio parar aqui...

04 dezembro 2011

(meus, seus) lábios

 
A verdade é que, quando nós nos beijamos pela primeira vez, eu perdi a consciência. Eu era você, era eu, era lábios, era mãos e cabelos e um sorriso, que ficou entre nós, visível só pra gente. Era só a gente. Um pedaço de mundo paralelo, uma realidade alternativa só nossa, em que tudo que importava era eu, você, o coração que batia no peito, feito musica, e esses lábios, deliciosos, que você nunca mais cessou de colocar sobre os meus. E eu nem queria mesmo que você se afastasse.
  E toda vez que você tenta, um passo só que seja pra trás, eu te puxo de volta, pra perto, pra onde eu posso alcançar e tocar e sentir, no peito, nas mãos, na língua - por que eu quero ter certeza que você está e vai ficar e que vai sempre me fazer sorrir desse jeito, entre beijos, entre os nossos lábios quase sempre silenciosos, sempre juntos. E eu não me importo com o que é de verdade, com o  que é mundo, como devia ser ou como vai acabar, se acabar, mesmo que sempre acabe. Quando você se inclina, eu já sei o que vai fazer, e o mundo desaparece e de novo e de novo e de novo somos só eu e você e lábios e aquele abraço que me mantém aquecida mesmo quando o mundo está gelado e está chovendo e o peito vai pesado por que vez ou outra, é inevitável, a gente vai se afastar e a solidão vai corroer meu peito feito ácido, névoa, deixando pouco mais que a estrutura pra você reconstruir. E você reconstrói. Você vem, me beija, me abraça, me esquenta, me faz em casa, me conforta, e antes que eu perceba já sou uma de novo, sou você, sou mais que antes, sou alguma felicidade alternativa inexplicável que parece que nunca vai acabar. De repente estou até curtindo a vida. E a culpa é sua. É você. São seus lábios, seus beijos, seus sentimentos, sua necessidade de mim e de me fazer feliz. E a gente se faz feliz. Eu e você e aquele beijo que é sempre o primeiro, nunca o ultimo, aquele beijo que é lar. Aquele beijo que define a gente. Aquele beijo que é amor.

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