22 agosto 2011

Nimbus (cinza-céu de amor).

- As vezes sinto que posso voar. Que posso ultrapassar as nuvens, ver o mundo do alto e tocar as estrelas ante de me deitar.
- Assim, de repente?
- De repente. Sinto a brisa, o corpo fica leve e de repente tudo é azul e lindo e leve.
  Ele sorri.
- E como é lá em cima?
- Depende. Na maioria das vezes é quente e confortável, e as nuvens são macias como num sonho. Mas, às vezes, sinto a água molhando meu rosto e o frio toma meu corpo. Vez ou outra vejo até mesmo um relâmpago cruzar o céu, transformando em luz tudo o que não sou eu. Como tempestade. Como depressão. Mas, mesmo assim... é mágico. É libertador, ainda que assustador.
- Parece bonito.
- É. As vezes, eu tenho vontade de ficar lá pra sempre. Ou de voltar, o mais rápido possível e me esconder em algum lugar quente, seco e seguro. Me esconder em você. Mas então, quando ponho os pés no chão, eu só quero ir até lá de novo e de novo. Me envolver no azul e branco, no rosa do fim da tarde, no cinza da tempestade...
- E por que você não vai?
- Eu bem que queria. Mas não é assim que funciona, simplesmente alçar voo, como pássaro ou pétala de flor. É o vento me leva quando quer, me mostra o quer e me aquece como quer. Não tenho controle, nunca tive, desses talvez sonhos que vivem no meu peito, dessa realidade alternativa de alta pressão que só eu posso viver. Eu bem queria ir mais vezes, eu queria levar você comigo e segurar sua mão enquanto mergulhamos nas nuvens. Mas não posso. E quando eu conto, ninguém vê que é real. Acham que estou alucinando. Dizem que não posso voar.
- O importante é no que você acredita.
  E meu riso é contido e talvez ingrato, mas sei que ele está certo. Faço silencio por um segundo inteiro.
- Você acredita?
  Pergunto, e ele me olha nos olhos, aqueles olhos profundos que com frequência são gentis quando se voltam pra mim. E de repente me vejo dentro de um oceano escuro, no qual teria me afogado não fosse sua presença familiar na imensidão atrás de mim. Sua presença, eu posso sentí-la, é sempre uma volta pra casa, um abraço suave, uma caricia que se propaga no infinito, ficando pra sempre como impressão em mim. Tateio ás cegas, perdida demais no seu castanho, e encontro sua mão há poucos centímetros da minha. Eu a aperto forte; como quem absorve tudo o que havia nele pra mim. Eu tomava um pouco do que era meu, mas vivia nele. Por que ele também era meu. E estava lá. E eu estava com ele. E eu sabia que ele acreditava em mim. Porque, afinal, ele também carrega sua própria realidade alternativa por aí. Nos olhos escuros de oceano profundo que ele exibe, gentis, só pra mim.

14 agosto 2011

Promessa.

Eu queria hoje poder sentar aqui e falar um pouco da minha dor. Mas não consigo. Ela já está tão velada no meu peito, tão envolta pela minha rotina sem você, que eu já não consigo separá-la de mim para encarar seus olhos e descrevê-la. È que desde criança eu vivo assim, preferindo não pensar pra não fazer doer. É que sua ausência me matou por muitos dias. Me fez chorar por muitos dias. Me fez pensar em porquês, em razões, em desesperança e em egoísmo. Eu era criança. Eu não entendia. Eu ainda não entendo. Nenhuma desculpa jamais vai ser suficiente pra entender por que o mundo levou você de mim. Eu te precisava tanto. Eu ainda preciso. Mas cresci, sobrevivi, sem a palavra e o significado que pra tantos é rotina. Eu não sei o que é. Não sei descrever. Não sei falar sobre. Desculpa, não acho que seja culpa de ninguém (a não ser talvez, daquele outro motorista que achou uma boa ideia dirigir do lado errado da pista). Mas aconteceu, e como num sopro, tudo o que eu tinha de você era poeira, meia dúzia de fotos e umas lembranças ruins, daquelas que a mente infantil nunca esquece, da bronca e dos gritos por causa de alguma coisa que eu fazia e não devia. Desculpa. Não faço mais. Nunca mais. Por que, agora, você não pode mais me corrigir. Então, o que eu deveria fazer? Qual é o plano de ação agora? Eu juro que eu tentei guardar silencio, brincar de forte, fazer de conta que eu não ligo. Eu juro que deixo escapar a palavra como quem não quer nada, como quem não se fere. E a escuto sair da boca de quem vive, de quem ainda tem, de quem não entende nada sobre o que eu sinto e se sente no direito de me dizer como devia ser. E eu sorrio falso, mas firme, que é pra ninguém achar que eu sou fraca, e que não superei. Mas eu não superei. Como poderia? Eu amo você. Daqueles amores que vão na alma, como devia ser. E eu sei que o seu também vai, lá do céu, de onde você estiver, você olha pra baixo, por mim, pra me guiar. Eu sei que você olha. Mas eu queria um abraço. Eu queria uma palavra. Eu queria lembrar dos seus olhos. Ah, céus, como eu queria ter mais que uma imagem e o som de um grito, que mesmo ruins, já se esvaíram a tempo da caixa da memória onde te guardei. E agora, pai? Eu vou ter que esperar pro infinito nos fazer reencontrar? È que dói. Mas eu te prometo, vou ser forte. Eu prometo, vou esperar. Vou fingir, se tiver, pra só você saber da minha dor, da minha espera, dessa nossa promessa. Pra não fazer doer naqueles que a gente ama também. A gente vai se reencontrar. Eu vou encarar esses olhos negros, que eu sei, eu espero, são da mesma cor dos meus. Vou achar meu rosto no seu, cara-a-cara, e não nas fotografias velhas em que eu não consigo mesmo te reconhecer. Vou chegar ai, pai. E vou viver até lá. E vou dar o meu melhor, pra viver feliz, pra alcançar. Mas vou chegar, pai. Olha por mim até lá. E guarda seus braços pro nosso abraço. Eu vou cobrar.

13 agosto 2011

Era.

A verdade é que eu vinha me escondendo em você há um tempão, e não tinha me dado conta. Eu vinha fingindo que não sabia, me enganando pra não perceber que, cedo ou tarde, eu ia ter que deixar você ir. Fazer você ir, se preciso fosse. É que eu sou meio tóxica, meio veneno,  meio perturbada. Tenho medo de (te) enlouquecer até fazer você me odiar, do fundo do peito, como quem precisa ir embora de qualquer jeito, por que faz mal ficar junto. Eu não quero isso, não. Quero que você tenha só boas lembranças. Umas doídas, que seja, mas não umas odiosas. Não daquelas que você vai contar pro mundo, pro mundo me desprezar também. Quero ser um segredo só nosso, um amor grande demais pra compartilhar, por que dói. E eu prefiro ser dor. Prefiro ser pra sempre teu calcanhar de Aquiles, aquele sorriso que voce só vai dar quando ver a chuva caindo na janela ou a pipoca molhar sem motivo. Você vai lembrar que eu detestava, que fazia careta, que te abraçava apertado, que te beijava devagar, e vai rir. E, quando perguntarem, você vai dizer que não era nada. Mas vai saber. Era tudo. Era o mundo. Era eu e você.

08 agosto 2011

Random.

A bem da verdade quero dizer que não vejo sentido em você. Assim como não vejo sentido em poesia, em arte alternativa demais e em músicas que são gritadas em minhas orelhas a tal ponto que as palavras se tornam incompreensiveis. Eu não gosto de palavras inconpreensiveis. Eu gosto mesmo é de escutar, de ver, de tocar letra por letra da verdade indomável que você guarda, ainda que a contra gosto, por que tenta tirá-la do peito aos berros e solos malfadados da guitarra que você não sabe tocar. Mas você tenta. E continua tentando. E eu não vejo sentido em sua tentativa, tal como não vejo nos berros dos malucos da esquina, que tentam atingir no grito um bem que vem no silêncio, no ar, na alma. Então não te entendo, não entendo mesmo, e nem acho que você entenda. Você nem sabe o que está buscando, eu vejo nos teus olhos cinzentos, perdidos, vagueando nas letras do que você chama de rock, rebeldia e libertação. E não é que eu saiba pra onde vou, tampouco, mas precisava dizer; você está tão perdido quanto eu, talvez até mais que eu. E aí está você, gritando, fazendo tanto sentido quanto poesia, quanto arte contemporânea, moderna, feita de riscos, tintas e faixas. E incapaz de tocar em mim, de olhar pra mim, de me fazer sentir e achar sentido. E eu não acho o teu sentido, teu caminho, tua crença e não sei pra onde você vai, pra onde quer ir, pra onde quer que eu vá, de mãos dadas contigo ou não. E eu precisava dizer pra fazer você ver. Eu juro, no silêncio faz mais sentido. Prosa faz mais sentido. Traço faz mais sentido. Pra mim faz mais sentido. E eu gosto de sentido. E gosto de você. Não que isso faça algum sentido, é claro. Mas bem que podia fazer. Eu ia gostar de entender você, pra variar. Aposto que você ia gostar também. E descobrir que prosa é muito melhor que verso. Mesmo sabendo que, às vezes, poesia fala comigo. Você fala comigo. E aí tudo faz todo o sentido.
Mas nossa, que confusão.


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