09 fevereiro 2012

Matrimonial.

  Seu corpo era meu travesseiro e eu sorria enquanto mergulhava em seus olhos muito azuis. Você era mar. E meu queixo parecia ter encontrado o lugar exato pra repousar sobre minhas mãos em seu peito, e meus olhos se fechavam por segundos inteiros acompanhando os movimentos do seu respirar mais profundo. E o subir e descer de nós dois era o oceano e éramos eu e você e 1,2,3, inspira, expira, te respiro, te navego.
  E no segundo que levei para, de lado, ouvir melhor teu coração - que era meu, de tantas formas - senti sua voz surgindo em volta de mim, me preenchendo e me elevando e acelerando meu coração, como se meu corpo entendesse tudo de nós antes de mim (é um efeito que só você causa).
Me ergui em meus cotovelos para te ver melhor, te olhar direito, te absorver. Meu rosto era uma interrogação.
- O que você disse?
- Quero casar com você.
  Eu o encarei por um minuto quase inteiro, mente em branco. Tudo o que eu via era o azul-mar e o eu-e-ele eterno que era pra ser. E ele sorria enquanto o mundo girava rápido demais pra eu acompanhar. Fechei minha boca, que eu nem tinha reparado que abrira.
- Casar?
- É, casar. Eu e você, altar, anéis, pra sempre. Essas coisas.
- Mas... A gente não pode casar.
- Por que não?
- Somos muito novos. Só estamos juntos há uns poucos meses...
- Onze. - Ele me interrompeu. - É tempo mais que suficiente pra saber se eu quero te amar pra sempre. E eu quero.
   Pisquei, perplexa com o quanto ele era capaz de simplificar as coisas. E ele sempre parecia tão certo do que dizia que quase me convencia. Mas não dessa vez.
- Não é assim. Não é só isso.
- E o que mais? Isso é o importante.
- Pra começar, nós nunca dividimos o mesmo teto mais que algumas noites. E se nós descobrirmos que não aguentamos as manias um do outro? Ou que o encanto acaba se for demais?  E com tudo isso de morar em outra cidade, você ainda nem conheceu meus pais! E se minha mãe não gostar de você? Pior ainda, e se você não gostar da minha mãe? Ou entrar numa briga com minha irmã, ou não conseguir entender o quanto meu irmão é especial?
  "E se você me machucar?" ficou guardado, latejando, pulsando sob todos os outros medos. As outras desculpas.

- Você só está arrumando pretextos bobos, amor. Eu tenho certeza de que vou me dar bem com sua família, toda ela. E se não for assim, vamos lidar com isso. Juntos. Eu não vou te deixar. Eu não quero. Nunca mais.
- Mas...
- Você não precisa ter medo.
- Esse é um passo muito grande. É claro que eu tenho medo. Você está me aterrorizando.
- Você tem essa mania de fazer de tudo um problema, e um problema grande demais. As coisas não são assim.  Eu te amo, e esse é simplesmente o próximo passo natural.
- Não sei disso não.
- Não seja infantil.
 Eu fiz bico, quase ofendida por um instante. Depois deixei pra lá.
- É só que casar - pronunciei como se fosse horrível, e ele sorriu - pode deixar tudo confuso. Pode transformar tudo em um pesadelo. Quero dizer, basta olhar os outros casais do mundo. Todos eles falam tão mal desse tipo de comprometimento... Eu tenho medo de estragar o que a gente tem.
 "Porque o que a gente tem é tudo o que eu tenho". Guardei novamente, mas eu sabia que ele podia ler a verdade nos meus olhos. Ele sabia. Sempre soube. Sempre esteve ciente da minha intensidade, que afastou a tantos outros, e mesmo assim segurou minha mão e me abraçou no escuro e afastou meus medos. Ele foi intenso por mim.
  E agora me encarava tão suavemente, tão acolhedor, tão cheio de amor nos olhos azuis que pensei talvez ter entendido ao contrário. Quem sabe ele não era o intenso de nós dois. Ele sorriu, como se lesse minha mente, e meu peito acelerou. Onze meses, e as mesmas reações adolescentes do primeiro dia.
- Não estou dizendo que não vai haver nuvens - talvez até uma ou duas tempestades, de tempos em tempos. Elas vão acontecer e nós vamos ter que lidar com elas. Tampouco posso dizer que as coisas não vão mudar entre nós. Quero dizer, poder chamar você de minha esposa? Vai me mudar pra sempre. Mas vai ser o mesmo amor entre a gente, então, vai dar tudo certo.
- Mas...
 Comecei, e ele colocou os dedos suavemente sobre meus lábios, calando meu argumento.
- Eu sei que a ideia é um pouco assustadora. É normal recear. Mas o que tem entre a gente é amor e é de verdade. E por mais que o mundo tente dizer o contrário, o amor é realmente muito simples. É fácil como respirar. É a gente que complica.
Engoli minhas palavras, uma a uma, enquanto ele continuava a falar. A voz era doce, era paraíso, era lar. Amor, sob qualquer perspectiva. E eu só queria amor mesmo. Só queria ele. Então, por que não?
- Sim.
 Eu disse simplesmente, interrompendo-o. Ele piscou.
- Sim?
- Sim. Eu quero me casar com você, pra sempre com você, amor com você. Sim, sim, sim.
 E ele pareceu levar um minuto inteiro para absorver minhas palavras. E então me puxou, colando os lábios nos meus enquanto sorria um sorriso que me fez ver, mais que perceber, que ele estava mesmo certo. Amar era muito simples.


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Teoricamente, isso era pra participar da edição dessa semana do Bloinquês. Mas além de tudo o que eu normalmente sou, eu sou também lesada, e escrevi um conto no tema da Edição Cartas. Bem, bem, perdi a oportunidade. Mas taí (eu fiz tudo pra você gostar de mim). 

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