07 fevereiro 2010

Telefonema.


O telefone tocou mas, como sempre, eu fiz pouco caso dele. Não me sentia à vontade no meio da linha telefônica, tendo que me contentar só com voz quando tudo o que eu queria era contato.
Não pretendia atender, mas fui vencida pela insistência de fosse quem fosse, que ligou mais de três vezes seguidas, pelo tempo que me pareceu a eternidade. Talvez eu deva dizer que a única coisa que me perturba mais que falar ao telefone era o som do mesmo. Sim, eu sou uma daquelas pessoas ranzinzas que detestam o toque do telefone. Ainda sim, fui simpática ao atender o meu aparelho abominado, colocado a força por minha mãe histérica na minha sala de estar, assim que fui morar sozinha.
- Olá.
- Boa Noite.
Não reconheci a voz, então cataloguei por alguns segundos quais seriam os homens que me ligariam àquela hora - por que aquela era, definitivamente, uma voz masculina. Seriam eles: meus tios, meus avós, meus irmãos ou meu melhor amigo gay em alguma emergência, mas eu reconheceria essas vozes facilmente. Não tinha idéia de quem era.
- Eu não quero parecer grossa, mas... quem é?
- Bem, você esqueceu fácil de mim. E rápido.
- Eu deveria me lembrar agora?
- Ora, passei a tarde com você.
Considerando que eu acabara de chegar em casa depois de passar o final de semana com cerca de 40 pessoas, a informação não queria dizer absolutamente nada. Ainda poderia ser qualquer um.
- Vai ter que ser mais especifico.
- Estou me sentindo usado.
- Eu abusei de você durante o fim de semana?
Perguntei, mas minha voz era um sorriso.
- Não, mas eu bem que queria.
Não me contive e gargalhei. Agora já sabia quem era. Somente uma pessoa seria adorável o suficiente no meio de todos aqueles para fazer esse tipo de brincadeira e ainda sim soar elogioso, ou divertido ou completamente amável.
- Tudo bem, agora eu sei quem é.
- Ora, o que um abuso não faz, não é?
- Não seja bobo.
- Não acho que possa mudar tão radicalmente.
Eu ri de novo.
- Tudo bem então, seja bobo. Mas me diga, o que você quer a essa hora? Já é tarde.
- Não é não.
- Bem, eu estou de pijamas, então eu diria que é sim. Eu estou em casa agora, e meu horário de balada perde completamente a validade aqui no meu refugio feliz.
Ele riu, e eu reconheci o som da risada, apenas para confirmar sua identidade. Me perguntei o que faria com que ele me ligasse tão de repente. Não sabia que tínhamos desenvolvido tal grau de intimidade em apenas alguns poucos dias. Era bom saber que eu tinha conquistado sua confiança em tão pouco tempo.
- Bem, então, o que tem a dizer?
- Diga-me quais são minhas chances com você.
Direto e simples, percebi. Sorri, percebendo que eu nunca o era. Provavelmente, nunca seria.
- Em escala?
- É, pode ser.
- Você quer o quê, de zero a dez?
- Eu quero do jeito que você preferir.
Sorri e agradeci, pela primeira vez em anos, por estar ao telefone. Ou ele teria me visto corar e todas as palavras a seguir seriam desnecessárias.
- Seis.
- Seis, de dez?
- É. O que acha?
- Acho que seis é um número muito bom.
- Mesmo?
- Claro. É mais que a metade. Pouco mais, é verdade, mas já quer dizer que você...
- Estou interessada?
- Isso é uma confirmação?
- Talvez.
Um silêncio, curto, se seguiu e eu me permiti aumentar meu sorriso.
- Você está decentemente vestida agora?
- Porque?
Perguntei, e acho que minha voz soou desconfiada demais. Talvez até assustada.
- Por que eu cheguei em casa, desfiz as malas, mas não consegui dormir. Então eu sai pra andar e liguei pra você.
- E isso quer dizer....?
- Que eu estou na sua calçada, no celular, perguntando se você esta interessada em mim o suficiente pra me deixar entrar. Ou pra sair.
- Você lembra que eu estou de pijamas, não é?
Eu disse, mas não soava mais assustada. Na verdade, estava tentada a aceitar sua oferta. Tentada demais, devo acrescentar.
- Não acho particularmente importante. Prometo que não vou abusar de você.
Eu ri.
- Me dá dois minutos.
- Como você quiser.
E eu tive, pela primeira vez desde a minha adolescência, receio em desligar ao telefone. Eu queria escutar a voz.
- Não desliga?
Eu pedi, e minha voz era quase infantil. Eu o escutei rir do outro lado da linha.
- Só quando você chegar aqui em baixo, eu prometo.
Não fiz muito enquanto andava pela casa a procura dos chinelos. Coloquei-os de qualquer jeito e me olhei no espelho do corredor, só pra constatar que estava de meias, além do pijama nada comprido. Suspirei, com preguiça apenas da idéia de me trocar. Então, num impulso, saí correndo.
Desci dois lances de escadas aos saltos (e as gargalhadas), e abri a porta do prédio antigo para dar de cara com a rua de paralelepípedos, meia dúzia de passantes, o céu mais estrelado de todos os tempos e ele, parado, me olhando feito bobo.
Eu ri apenas por ver seu olhar. Ele agora parecia entender com que espécie de maluca ele tinha se metido. Mas parecia achar isso divertido, tanto quanto eu, ouso dizer.
Não hesitei muito; fui até ele, com minhas meias e chinelos, e joguei meus braços em volta do seu pescoço, com um sorriso que eu sabia ser divertido, ainda por minha inesperada corrida pelas escadas. Ele também sorria em resposta.
- Parece surpreso.
- Não esperava que corresse.
Ele disse, mas o tom ainda era divertido.
- Eu apenas fiquei com preguiça de me trocar. Era correr ou desistir.
- Eu corria o risco de sua preguiça me manter longe de você por mais um dia inteiro?
- Minha preguiça me faz fazer ou deixar de fazer todo tipo de coisas. Então não reclame.
Ele riu.
- Eu não seria capaz.
- Agora, a gente pode parar de falar.
Eu disse, e o sorriso dele assumiu um tom novo.
- Eu não ia sugerir isso tão rápido. Eu ia arrumar outra maneira divertida de transformar seu seis em, não sei, talvez um oito.
- Eu desci as escadas aos saltos, então acho que você pode ter o numero que quiser.
- Você está se entregando agora?
- Não. Estou te dando uma chance.
- Não parece ruim.
- Não é. Você tem um beijo, uma boa conversa e um boa noite. E isso é tudo.
- Para o primeiro dia, não parece tão ruim.
- Bem, que bom que chegamos a esse acordo.
Ele sorriu e aproximou os lábios dos meus. Eu o fiz parar antes que atingisse o alvo; não que eu não estivesse cheia de vontade dos dele.
- Só me faça uma promessa?
- Já no primeiro dia?
Ele perguntou, parecendo achar graça.
- Pegar ou largar.
Ele me olhou, nos olhos primeiramente, mas seus olhos não demoraram para voltar aos meus lábios. Ele sacudiu a cabeça positivamente, vencido.
- É só dizer.
- Sem telefonemas.
Ele sorriu.
- Acho que posso tentar isso.
- Tudo bem então.
E nós nos beijamos.

5 comentários:

  1. LINDO! *-*
    MERECE CONTINUAÇÃO! *___*
    Me deu até saudades do Wagner. (L)
    Adoro você.
    Beijos

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  2. Caraca =D

    Muito legal

    adorei
    espero que essa histórinha/conto continue

    achei super fofo

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  3. já disse que amo o que você escreve né?

    mas não acho que mereça continuação, a magia dele está em terminar assim!

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  4. Releio suas frases com saudade de você =)

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agora é a hora em que você rabisca a sua mensagem no meu infinito pessoal :)


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