12 maio 2014

Mais uma dose


- O que você acha que está fazendo?
- Beijando você.
Meus olhos se arregalam, mas não sou capaz de negar você assim tão de perto. E como da primeira vez, me perco num mundo em que somos só eu e você e os segundos em que meus olhos se fecham duram algumas eras. É o inferno.
- Achei que a gente não ia mais fazer isso. Achei que você ia voltar com a sua namorada.
- Mas você é bonita demais.
- Cala a boca.
- E é mais que isso também. Você sabe.
- Para, por favor.
- Eu vou embora amanhã. Eu não quero ir pensando que eu devia ter feito isso.
- E como isso pode ser justo?
- Nunca foi justo. Eu sempre tive data pra ir embora. – Minha expressão desanima e ele sorri aquele sorriso maroto que eu me acostumei a odiar nas duas semanas que passamos juntos. Ele acaricia meu rosto, a expressão dele quase curiosa, quase doce. – Você queria que eu ficasse mais?
- Não. Na verdade, estou louca pra você ir embora. – Eu digo, rebelde, mas ele pousa os lábios sobre os meus e o sorriso enfurecedor me desarma por completo.
- Mesmo? – Ele está brincando comigo, eu sei, mas eu não consigo evitar ceder um pouquinho. Ou muito.
- Talvez. Ah, cara, eu odeio você.
- Nah, que nada. Você não teria vindo todo dia de tão longe se não gostasse de mim.
- Eu só não queria que você ficasse sozinho, por que seria uma droga. E eu ia me sentir meio mal. Então eu meio que fiz por mim, eu juro. Por que eu sou uma pessoa legal.
- Claro que é. – Ele concorda, os lábios agora descendo pelo meus pescoço, mandando todas as vibrações erradas pelo meu corpo. – Mas você gosta de mim. Pode admitir, eu sou o seu tipo.
- Baixinho e convencido? Não são os meus preferidos.
Eu arrisco, mas você não me dá atenção. Você não está prestando atenção em nada que não seja pele, na verdade.
- Não adianta negar, você veio todos os dias.
- Você é um babaca, sabe. – Eu digo, e você concorda com a cabeça, braços ocupados em me abraçar bem perto. – Meio que doeu meu ego quando você explicou as coisas da primeira vez. Eu me senti idiota. Um pouco usada.
- Desculpa. Eu gostei de você, e eu meio que precisava da companhia.
- Eu sei. – Minhas mãos já não estavam exatamente me obedecendo, cruzando meus braços ao seu redor e se entranhando no seu cabelo sem ordem específica. Era familiar demais. – Foi por isso que eu continuei vindo. Além do que, você não era uma companhia tão terrível, e eu estava de férias.
Ele se afasta um pouco pra me olhar nos olhos, mas ao o suficiente para que nossos braços larguem o abraço um do outro. Não faz maravilhas a minha já danificada linha de raciocínio.
- Então, você gosta de mim?
- É, é.
Eu admito, e o sorriso que se estende em seu rosto é tão convencido que eu me arrependo de ter aberto a boca – mas também me faz querer beijá-lo, então fico em silêncio.
- Então vamos fazer isso. É minha última noite, minha última chance de ficar com você. Eu não quero desperdiçar.
- Mas...
- A gente vê o resto depois, isso é agora. Última chance. Última noite. Você e eu.
E é errado e eu não devia, mas ele está tão per e é só por essa noite – a última noite – e eu não consigo resistir. Meus olhos se fecham, eu nos aproximo e o beijo e me perco sem dar muito atenção pra seja lá o que minha mente diz. Suspiro.
- Por que é seu aniversário. Por que eu nunca vou te ver de novo. Uma noite.
- Uma noite.
Ele repete, os olhos absurdos resplandecendo e eu não sei mais identificar o que é sanidade. A ideia até me assusta. Mas ele sorri, e quem se importa?
Nossos lábios não se deixam a noite toda, e a mao dele na minha sente tao familiar que machuca um pouco. Mas é a última noite, então eu aproveito, e peço mais uma dose.

É a última vez, afinal de contas.

Layout por Thainá Caldas | No ar desde 2009 | Tecnologia do Blogger | All Rights Reserved ©