Ele se cala
por um segundo (eu me calo por um segundo) e a gente se cala pela eternidade. Eu
não tenho mais mentiras pra dizer. Minhas verdades tem pingado por meus poros.
Minhas palavras tem saído em meio a lágrimas. Você acha que eu exagero, você me diz rudezas,
você não acredita mais em mim e, nessas noites, toda minha água me deixa aos
borbotões. Nossos gritos ecoam na noite, acordam os vizinhos, sacodem as
paredes. Nossas portas batem e meu coração vai contigo, corredor afora, rua afora,
cidade adentro. Você me deixa e eu ocupo seu lugar na cama, sentindo o cheiro
de nós dois que você deixa pra trás quando se vai. É que a gente é muito um do
outro pra não ter aroma de nós dois, no plural. Não sei como fica o cheiro da
minha pele quando você não está comigo. Não sei o que é ser singular. Não
lembro mais.
Nossas
conversas tem matado cada vez um pouco mais de mim e eu já não tenho sido
ninguém. Minha personalidade se desfez e desapareceu em fumaça. Meu riso morreu
em ecos da gente e se eu me olho no espelho, não sei quem é a mulher apagada,
esvaída, descolorida que me encara de volta. Tão diferente da menina que se
casou por amor com um homem que ria fácil. E aí fica difícil (tão difícil que eu acho que
não é real, as vezes).
As coisas se
tornaram tão complicadas, as coisas andam tão solitárias (E eu sinto tanto a
tua falta, as vezes, que caminho pé ante pé até aquela caixa de lembranças e
redesenho tuas letras e tuas cartas sempre me fazem chorar. Você de lembrança é
melhor que você do quarto ao lado). (Volta pra mim).
E eu fico me
lembrando das nossas meias noites antes dos gritos, dos cigarros, das doses de
Whisky fora de hora pra ajudar a descer o amargo do nosso amor que foi
morrendo. Eu me lembro da gente das taças de vinho, do macarrão com cara de
alta sociedade que você fazia vestindo só o avental e o sorriso, e da conversa
doce e lenta e cheia de olhares e luz de velas que a gente dividia até o
amanhecer. Eu lembro da gente quando ainda era amor e toda palavra não acabava
em dor e suor e lagrima e você me deixando pra encarar a porta marrom que bate,
que bate, que bate (em mim, que fico pra trás).
Eu me lembro das nossas meias noites de doçura. Eu me lembro de tudo antes do silêncio (de mim, de você, da gente pra eternidade). Eu me lembro da gente antes da morte. Eu me lembro da gente antes de tomar o comprimido que termina com tudo. E eu me lembro da gente enquanto encaro o teto. E eu me pergunto se o fim de mim vai ser suficiente pra que você se lembre também (anda tudo tão complicado, afinal de contas).
Eu me lembro das nossas meias noites de doçura. Eu me lembro de tudo antes do silêncio (de mim, de você, da gente pra eternidade). Eu me lembro da gente antes da morte. Eu me lembro da gente antes de tomar o comprimido que termina com tudo. E eu me lembro da gente enquanto encaro o teto. E eu me pergunto se o fim de mim vai ser suficiente pra que você se lembre também (anda tudo tão complicado, afinal de contas).
E o relógio
bate meia-noite.
(E eu espero
que a morte seja doce e que não doa mais saudade).