- Porque você me deixou partir, em primeiro lugar? Se acreditava mesmo na gente, não devia ter me deixado ir.
- Foi você quem quis.
- Você deixou. Disse adeus e tudo.
- O que eu deveria ter feito? Segurado você?
- Talvez. Eu não sei. Eu só queria que você não tivesse desistido tão fácil.
- Você também desistiu.
- É. Foi a minha decisão. Partir. Eu quis ir embora.
Ele sentiu alguma coisa ferir dentro dele. Ela era cruel. E linda.
E continuou.
– O que eu quero dizer é: se você não estava de acordo, devia ter me dito. Naquele momento, enquanto eu ainda estava quente, disposta e indecisa. Quando a idéia de partir me deixava com o coração na mão.
- Você não se arrependeu? Não sente a minha falta?
Os olhos dela penetraram fundo nos dele, e ele pode quase divisar a sinceridade correndo pelo castanho claro envolvente que eles eram. E tudo o que respondeu foi o encolher os ombros, como quem se desculpa. A expressão, no entanto,não era culpada.
- Não de verdade. Doeu um pouco, no começo, mas nunca foi insuportável.
- Pra mim foi.
- Sinto muito.
Ele esfregou o rosto, de repente consciente do que aquilo significava. Não teria volta.
- Acabou mesmo, não é?
- É, acabou sim.
- Por que você veio, então? Por que me deixou vir?
- Achei que devia isso a nós dois.
- Mas você já sabia que...
- Eu não vim com a intenção de recomeçarmos, se é isso que você está perguntando.
- Então, por que...?
- Eu não sei. Eu só achei que não ia machucar vir até aqui e conversar.
- Fale por você.
A expressão dela assumiu então um tom sério, essencialmente preocupado, culpado até. Ele viu os lábios dela formando o seu típico “Oh não”, e interrompeu-a antes que o deixasse escapar.
- Não tenha pena de mim.
- Eu não tenho. – E fez uma pausa, como que para se certificar que era verdade. - Não, não tenho. Eu só não achei que isso poderia fazer algum mal.
- Eu só queria que você tivesse dito “não” então.
- Eu jamais imaginaria que você criaria esperanças. Você sempre me conheceu tão bem. Você sabe que eu não volto atrás.
E era verdade, ele sabia. Só não queria acreditar.
- Acho que eu desejei que fossemos uma exceção.
- Eu não...
- É, eu sei. Você nunca abre exceções. “Regras tem motivo de ser”.
E ela deu um sorriso curto, sem graça e sem palavras.
E de repente ele se sentiu muito exposto, muito sozinho, muito ingênuo. Murmurou que era melhor ir embora. Ela não disse nada, mas ele leu o adeus nos seus olhos.
Olhou pra ela sem saber exatamente o que fazer a seguir. Ela sempre fora tão efusiva, toda abraços, toda lágrima, toda confiança. E agora estava ali, mãos nos bolsos, expressão curiosa. Esperava pelo movimento dele. Esperava pelo adeus definitivo que ele não sabia se podia dar. É que nele doía tanto.
- Eu posso te dar um beijo?
- Só se me der também um abraço.
- Acho que posso lidar com isso.
- Eu espero que sim.
Ela não precisava dizer aquilo, mas esse era o bonito nela: era tão delicadamente desnecessária. Era amável, era divertida, inesquecível e incapaz de ser contida. E por isso partia sem muitas dores, deixando amores, deixando abraços e o perfume dos cabelos nos travesseiros. E as saudades. Ah, as saudades que ficavam, tão insuportáveis.
Ele se aproximou e a apertou entre os braços por um breve instante, se sentindo incapaz de deixá-la ir. Mas ela o soltou e depositou-lhe o pedido beijo nos lábios saudosos, mas de leve, com cautela, para não ferir-lhe o coração. E ele sorriu, mas queria chorar. Perdera-a.
E lá ia ela, sussurrando adeus, seus passos longos no salão, sem olhar pra trás e sem chorar lembranças. Ela nunca chorava lembranças. É que seus olhos estavam sempre ocupados brilhando futuro. Brilhando novos abraços e beijos, novos amores, novas feridas e despedidas. Novos pedidos para que não a deixassem partir. Para que a segurassem para sempre. Para que a amassem pra sempre.